Emoções e estômago: a ciência por trás da sensação visceral.
- chrisbuarque

- 14 de set.
- 4 min de leitura
Quem nunca disse ter sentido um “nó no estômago” em um momento de ansiedade, ou “borboletas no estômago” diante de uma situação empolgante? Durante muito tempo, essas expressões foram tratadas como meras metáforas. No entanto, a ciência tem mostrado que essa relação entre emoções e estômago é mais literal do que imaginávamos. Estudos recentes vêm revelando que o estômago não é apenas um órgão digestivo: ele participa ativamente do processamento emocional, em uma comunicação bidirecional intensa com o cérebro.
Essa conexão faz parte do chamado eixo cérebro-intestino, uma rede que envolve o sistema nervoso central, o sistema nervoso entérico (o “segundo cérebro”), o nervo vago e até o microbioma intestinal. Quando sentimos medo, ansiedade, alegria ou nojo, não estamos apenas experimentando algo na mente. Essas emoções reverberam no corpo, especialmente no trato digestivo.
Evidências científicas recentes
Um estudo publicado em 2024 na revista Nature Communications trouxe uma descoberta inédita: pesquisadores italianos utilizaram cápsulas ingeríveis capazes de medir, em tempo real, variáveis como pH gástrico enquanto voluntários assistiam a vídeos que despertavam diferentes emoções, como medo, nojo, tristeza e alegria (Porciello et al., 2024). O resultado mostrou que o estômago reage de forma distinta a cada emoção. Emoções negativas, como medo e nojo, estavam associadas a um aumento da acidez gástrica, enquanto emoções positivas geravam padrões opostos. Além disso, os participantes relatavam sentir sensações físicas na região do estômago que correspondiam aos dados fisiológicos coletados. Esse estudo oferece evidências diretas de que as emoções realmente “passam pelo estômago”, não apenas de forma simbólica, mas fisiológica.
Mais recentemente, em 2025, um grupo da Aarhus University, na Dinamarca, investigou a sincronia entre o estômago e o cérebro em pessoas com diferentes níveis de ansiedade, estresse e sintomas depressivos, utilizando exames de fMRI combinados com registros do ritmo elétrico estomacal (electrogastrograma). Publicado na Nature Mental Health, o estudo revelou que quanto maior a sincronização entre os padrões elétricos do estômago e a atividade cerebral, mais elevados eram os índices de sofrimento psicológico. Isso sugere que, em situações de angústia emocional, o cérebro e o estômago podem entrar em um estado de hiperconexão, potencializando a sensação física das emoções.
Outro campo de pesquisa relevante envolve o microbioma intestinal, que inclui as bactérias presentes em todo o sistema digestivo, inclusive no estômago. Um estudo conduzido com mulheres saudáveis, publicado em 2023 na Psychological Medicine, mostrou que emoções negativas estavam associadas a composições específicas de microbiota, enquanto estratégias de regulação emocional, como a supressão de sentimentos, estavam relacionadas a menor diversidade microbiana. Essas descobertas apontam que nossos estados emocionais não só afetam o corpo, mas podem também moldar a ecologia interna do nosso trato digestivo, com impactos de longo prazo na saúde física e mental.
Pesquisas anteriores já indicavam esse vínculo. Estudos em animais demonstraram que inflamações gástricas podem induzir comportamentos semelhantes a ansiedade e depressão. Além disso, revisões neurocientíficas têm documentado como áreas do cérebro, como a amígdala, regulam respostas viscerais ligadas ao estresse, o que ajuda a explicar por que emoções intensas podem se manifestar fisicamente na região do estômago.
Mecanismos que conectam emoção e estômago
Vários processos biológicos explicam por que sentimos as emoções “na barriga”. O nervo vago, por exemplo, funciona como uma via de comunicação em mão dupla: ele leva sinais do trato digestivo para o cérebro e também regula funções do estômago. Outro conceito central é a interocepção, a percepção consciente das sensações internas do corpo. Quando você percebe aquele frio no estômago antes de falar em público, está vivenciando a interocepção em ação.
Além disso, o microbioma intestinal produz moléculas que influenciam neurotransmissores como serotonina e dopamina, que estão diretamente relacionados ao humor. Já os ritmos elétricos estomacais, mesmo quando não há alimento presente, apresentam ciclos que podem sincronizar-se com padrões cerebrais durante momentos de estresse, como demonstrado no estudo dinamarquês. Por fim, processos inflamatórios no estômago e intestino também são capazes de afetar o humor por meio de substâncias inflamatórias que alcançam o sistema nervoso central.
O que a ciência ainda não sabe
Apesar dos avanços, ainda existem muitas perguntas em aberto. Em grande parte dos estudos, não está totalmente claro se a disfunção gástrica causa emoções negativas ou se são as emoções negativas que provocam alterações no estômago. A relação, provavelmente, é bidirecional. Além disso, muitos experimentos envolvem grupos pequenos ou populações específicas, como apenas mulheres ou pessoas saudáveis, limitando a generalização dos resultados.
Outro ponto importante é a variação individual. Algumas pessoas têm maior sensibilidade visceral e percebem de forma intensa qualquer alteração no estômago, enquanto outras quase não registram essas sensações. Isso significa que a experiência emocional “no estômago” pode ser subjetivamente muito diferente de pessoa para pessoa.
A hiperconexão entre cérebro e estômago: quando sentir demais pode ser sinal de sofrimento emocional
É comum associarmos uma boa conexão entre corpo e mente a equilíbrio e saúde. Porém, pesquisas recentes mostram que uma hiperconexão entre o cérebro e o estômago pode ser, na verdade, um marcador de sofrimento emocional.
Um estudo realizado na Aarhus University, na Dinamarca, publicado em 2025 na Nature Mental Health, analisou mais de 240 pessoas usando exames de imagem cerebral (fMRI) combinados com registros elétricos do estômago, por meio do electrogastrograma. Os cientistas descobriram que, em indivíduos com altos níveis de ansiedade, estresse ou sintomas depressivos, havia uma sincronia intensa entre os ritmos elétricos do estômago e padrões de atividade cerebral.
À primeira vista, isso pode parecer algo positivo como se o corpo e a mente estivessem em perfeita harmonia. No entanto, essa hiperconexão parece indicar que o organismo está em estado de alerta constante, amplificando a percepção das emoções no corpo. É como se a mente estivesse “presa” aos sinais físicos do estômago, criando um ciclo de retroalimentação que intensifica o sofrimento emocional.
Essa descoberta muda a narrativa tradicional sobre o eixo cérebro-intestino. Em vez de considerar qualquer conexão como algo benéfico, os pesquisadores alertam que “sentir demais” pode ser sinal de que o sistema está sobrecarregado. Esse fenômeno ajuda a explicar por que pessoas ansiosas ou deprimidas frequentemente relatam sintomas digestivos, como dor abdominal, náusea ou “nó no estômago”.
O dado mais relevante é que essa hiperconexão pode funcionar como um biomarcador para saúde mental, auxiliando no diagnóstico precoce e até na criação de tratamentos que visem modular essa relação, seja por meio de intervenções no sistema digestivo, no cérebro, ou em ambos simultaneamente.
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